Read O DIÁRIO DE BRIDGET JONES Online
Authors: Helen Fielding
—
Bom,
você saberia isso se, em vez de ficar horas lendo folhetos,
passasse a ler jornais - alfinetou Daniel com um sorriso.
—
Mas
então o que
está
acontecendo na Bósnia?
—
Nossa,
que peitos tem aquela dama de honra.
—
E
quem são os muçulmanos bósnios?
—
Não
dá para acreditar no tamanho da lapela daquele homem.
De
repente, tive certeza absoluta de que Daniel estava tentando mudar de
assunto.
—
Os
sérvios-bósnios são da mesma raça
daqueles que atacaram Sarajevo? - perguntei.
Silêncio.
—
Então
a quem pertence Srebrenica?
—
Srebrenica
é uma
área
de segurança
-
informou Daniel com uma voz bem antipática.
—
Mas
então por que as pessoas da área de segurança
estavam atacando antes?
—
Cala
a boca.
—
Explique
só uma coisa: os bósnios de Srebrenica não são
os mesmos de Sarajevo?
—
São
muçulmanos - disse Daniel triunfante.
—
Sérvios
ou bósnios?
—
Escuta,
você não pode calar a boca?
—
Você
também não entende nada do que está acontecendo
na Bósnia.
—
Entendo.
—
Não
entende.
—
Entendo.
—
Não
entende
.
Nesse
momento, o porteiro do hotel - que usava calça amarrada na
altura dos joelhos, meias brancas, sapatos de couro com fivela,
sobrecasaca e uma peruca empoada - aproximou-se e disse, baixo:
—
Acho
que os primeiros habitantes de Srebrenica e também de Sarajevo
eram muçulmanos bósnios, senhor. - E acrescentou, bem a
propósito: - Não gostariam de receber os jornais pela
manhã no apartamento?
Pensei
que Daniel fosse dar um soco nele. Afaguei seu braço e falei:
—
Está
bem, vamos, vamos, não tem problema – como se ele fosse
um cavalo de corrida que se assustou com uma Kombi passando.
17h30.
Brrr. Em vez de ficar com Daniel ao sol quente à beira do
lago, usando meu vestido longo e vaporoso, fiquei azul de frio num
barco, enrolada numa toalha do hotel. Acabamos voltando para o quarto
para tomar um banho quente e uma cerveja e descobrimos que outro
casal não-convidado para o casamento nos faria companhia na
sala de jantar aquela noite. A porção feminina do casal
era uma moça chamada Eileen com quem Daniel tinha dormido duas
vezes, mordido sem querer o peito dela com muita força e
depois nunca mais falado.
Quando
saí do banho, Daniel estava deitado na cama rindo.
—
Arrumei
uma dieta nova para você - informou.
—
Quer
dizer que você
acha
que estou gorda.
—
Está
bem, é assim. É muito simples. Basta você não
comer nada que precise pagar. Então, no início da dieta
você está gordinha como uma porquinha e ninguém a
convida para jantar. Depois emagrece, fica um pouco mais esbelta e
famélica, e as pessoas começam a levar você para
jantar. Aí você engorda um pouco, os convites somem e
você começa a emagrecer de novo.
—
Daniel!
- explodi.
—
Essa é a coisa mais sexista, gordofóbica e cínica
que já ouvi.
—
Ah,
não precisa exagerar, Bridge - disse ele. – Essa idéia
é o prolongamento lógico do que você mesma acha.
Eu sempre digo que ninguém gosta de mulher com pernas de
gafanhoto. Os homens querem que a mulher tenha um traseiro onde
possam encostar uma bicicleta e colocar uma caneca de cerveja em
cima.
Fiquei
dividida entre a imagem grotesca de uma bicicleta encostada na bunda
e uma caneca em cima, fúria contra Daniel por seu sexismo
totalmente irritante e a idéia repentina de que talvez ele
tivesse razão sobre o conceito que eu fazia do meu corpo em
relação aos homens e, nesse caso, se eu precisava de
alguma coisa deliciosa para comer imediatamente e o que poderia ser.
—
Vou
dar uma ligada na tevê - disse Daniel, aproveitando que fiquei
temporariamente muda para apertar o controle remoto e fechar as
cortinas que eram daquelas grossas, forradas de preto. Segundos
depois a sala ficou completamente escura, exceto pela chama do
isqueiro. Daniel tinha acendido um cigarro e estava pedindo à
copa seis latas de cerveja Fosters.
—
Quer
alguma coisa, Bridge? - perguntou, rindo afetado.
—
Chá com creme, por exemplo? Eu pago.
JULHO
Argh
DOMINGO,
2 DE JULHO
55,3
kg (continuo indo bem), 0 unidade alcoólica, 0 cigarro, 995
calorias, 0 bilhete de loteria: perfeito.
7h45.
Mamãe acaba de
ligar.
—
Alô,
querida, adivinha o que aconteceu?
—
Um
instante, vou levar o telefone para o outro quarto - falei, olhando
nervosa para Daniel, deitado na cama. Desliguei o telefone na parede,
saí do quarto sem fazer barulho, liguei o telefone de novo e
constatei então que minha mãe não tinha
percebido nada e continuava falando com o telefone desligado.
—
Então,
o que você acha, querida?
—
Não
sei, eu estava levando o telefone para o outro quarto, como eu disse
- respondi.
—
Ah,
quer dizer que você não escutou nada?
—
Não.
- Houve um pequeno silêncio.
—
Alô,
querida, adivinha o que aconteceu? - começou ela outra vez. Às
vezes acho que minha mãe faz parte do mundo moderno; às
vezes, que vive num outro planeta. Como quando deixa recado na minha
secretária eletrônica dizendo apenas, alto e bom som:
"Aqui é a mãe de Bridget Jones."
—
Alô? Alô, querida, adivinha o que aconteceu? - repetiu.
—
O
quê? - respondi, resignada.
—
Una
e Geoffrey vão dar uma festa à fantasia chamada
Vigários e Vagabundas, no dia 29 de julho. Não acha
ótimo? Vigários e Vagabundas! Imagina só!
Fiz
um esforço para não imaginar nem ver Una Alconbury de
botas justas, meias arrastão e sutiã de
strip-tease
.
Pessoas de sessenta anos organizando uma festa desse tipo me parecia
antinatural e errado.
—
Mas
achamos que seria o máximo se você e - seguiu-se um
silêncio pudico e pesado - Daniel viessem. Estamos loucos para
conhecê-lo.
Quase
desmaiei só de pensar na minha relação com
Daniel sendo dissecada nos menores detalhes pelos comensais da
Associação Salva-Vidas de Northamptonshire.
—
Não
acredito que Daniel vá.
Exatamente quando eu
disse isso, caiu a cadeira em que eu me balançava apoiada na
mesa com os joelhos. Fez um barulhão.
Quando
peguei o telefone de novo, minha mãe continuava falando.
—
Olha,
vai ser ótimo. Parece que Mark Darcy também vai,
acompanhado, assim...
Daniel
apareceu na porta, completamente nu.
—
O
que houve? Com quem você está falando? - perguntou.
—
Com
minha mãe - respondi, desesperada, com o canto da boca.
—
Dá
aqui - disse ele, pegando o telefone. Gosto muito quanto ele
demonstra autoridade, mas sem estar irritado, como agora.
—
Sra.
Jones, aqui é Daniel - disse ele, com a voz mais charmosa
possível.
Quase
dava para eu ver mamãe, toda cheia de dedos.
—
É
um pouco cedo demais para ligar num domingo. É, está
mesmo um lindo dia. Podemos ajudar em alguma coisa?
Ele
me olhou enquanto escutava mamãe falando por alguns minutos,
depois voltou a prestar atenção nela.
—
Ah,
seria ótimo. Vou anotar na agenda no dia 29 e procurar minha
camisa de colarinho duro. Agora, gostaríamos de voltar para a
cama e dormir. A senhora se cuide. Até logo - disse ele com
firmeza e desligou.
—
Viu? Basta só um pouco de firmeza - garantiu, todo presunçoso.
SÁBADO,
22 DE JULHO
55,
8 kg (hum, tenho de perder uns 500 gramas), 2 unidades alcoólicas,
7 cigarros, 1652 calorias.
Estou
adorando a idéia de Daniel ir comigo à festa Vigários
e Vagabundas, no próximo sábado. Vai ser ótimo:
uma vez na vida não terei de dirigir sozinha, chegar sozinha e
enfrentar aquela inquisição de por que não
arrumei um namorado. Vai estar um lindo dia de verão. Talvez a
gente até possa dar uma paradinha no caminho e passar a noite
numa pousada (ou num hotel sem tevê no quarto. Estou louca para
Daniel conhecer meu pai. Tomara que goste dele.
Duas
da manhã.
Acordei
aos prantos por causa de um sonho horrível que estou tendo no
qual estou fazendo uma prova de francês e enquanto olho as
questões me dou conta de que esqueci de estudar e estou
vestida só com o jaleco de ciências, tentando
desesperadamente amarrá-lo na cintura para que a Srta.
Chignall não perceba que estou sem nada por baixo. Pensei que
Daniel fosse pelo menos solidário. Sei que o pesadelo está
relacionado com minhas preocupações de trabalho, mas
Daniel só acendeu um cigarro e pediu para repetir a parte do
jaleco de ciências.
—
Você
não sabe o que é isso, já que tem seu bendito
diploma de Cambridge - murmurei, fungando.
—
Mas jamais esquecerei quando vi no mural da escola minha nota cinco
em francês, o que significava que não poderia ir para
Manchester. Aquela nota mudou minha vida.
—
Você
devia agradecer a sua boa estrela, Bridge – disse ele, deitando
de costas e soprando a fumaça para o teto.
—
Você teria certamente se casado com algum chato chamado
Geoffrey Boycott e passaria o resto da vida limpando gaiola de
passarinho. Mas - ele começou a rir .- não tem nada de
errado em ter um diploma de ... de... (ria
tanto
que mal conseguia falar) Bangor.
—
Agora
chega. Vou dormir no sofá - gritei, pulando da cama.
—
Ei,
não faça isso, Bridge - disse ele, me puxando.
—
Você sabe que eu acho você
uma ...
grande
intelectual. Só precisa aprender a interpretar sonhos.
—
Então
o que o sonho está querendo me dizer? - perguntei,
mal-humorada.
—
Que não correspondi à minha capacidade intelectual?