Read O DIÁRIO DE BRIDGET JONES Online
Authors: Helen Fielding
QUARTA-FEIRA,
20 DE DEZEMBRO
5h30
da manhã.
Ai, Deus. Ai, Deus. Onde estou?
QUINTA-FEIRA,
21 DE DEZEMBRO
58,5kg
(na verdade, não tenho motivo de emagrecer até o Natal
já que estou tão empanturrada – em qualquer
momento a partir da ceia de Natal é perfeitamente aceitável
recusar comida, já que está todo mundo empanturrado.
Aliás, acho que é a única época do ano em
que comer não é problema).
Passei
os últimos dez dias num estado de permanente ressaca e levando
uma subvida, sem fazer as refeições direito nem comer
pratos quentes.
O
Natal é uma espécie de guerra. Fazer compras na Oxford
Street é algo que me a
meaça.
Será que a Cruz Vermelha ou os alemães vão
chegar e me descobrir? Argh. São 10 horas da manhã. Não
fiz as compras de Natal. Não mandei os cartões. Tenho
de ir trabalhar. Certo, nunca, mas nunca mais na vida eu vou beber.
Argh, telefone.
Argh.
Era mamãe, mas podia muito bem ser Goebbels tentando me
convencer a invadir a
Polônia.
—
Querida,
estou ligando só para saber a que horas você vai chegar
na sexta à noite.
Com
incrível competência, mamãe planejou um Natal
familiar cheio de afeto: ela e papai estão fazendo de conta
que nada aconteceu o ano inteiro, uma atitude "para o bem das
crianças", isto é, eu e Jamie, que tem 37 anos.
—
Mãe,
acho
que já falamos sobre isso: não vou para sua casa na
sexta-feira, vou na noite de Natal. Lembra que combinamos tudo?
Naquela primeira vez que você ligou, em agosto ...
—
Ah,
não seja
boba,
querida. Você não vai ficar sozinha no seu apartamento o
fim de semana inteiro quando estamos em época de Natal. O que
vai comer?
Argh.
Detesto essas coisas. Como se, pelo simples fato de ser solteira,
você não tivesse
um
lar, amigos ou compromissos, e é considerada egoísta
por se recusar a ficar à disposição de todos o
Natal inteiro e feliz porque vai dormir torta num saco de dormir no
quarto dos adolescentes, descascar batatas o dia inteiro para 50
pessoas e ser
gentil
com pervertidos a quem chama de tios, enquanto eles ficam olhando
seus peitos.
Já
meu irmão pode ir e vir quando bem entende, todo mundo acha
ótimo e compreensível só porque ele consegue
viver com uma eco-chata praticante de
tai
chi chuan.
Honestamente, eu preferia tocar fogo no meu apartamento a ficar nele
com Becca, a namorada de Jamie.
É
espantoso minha mãe não demonstrar gratidão a
Mark Darcy por ele ter resolvido tudo para ela. Pelo contrário:
ele passou a fazer parte daquele assunto que não deve ser
comentado, isto é, o grande drama do condomínio, e ela
se comporta como se ele jamais tivesse existido. Tenho certeza de que
ele teve um bocado de trabalho para conseguir recuperar o dinheiro de
todo mundo. Mark Darcy é uma pessoa óti
ma.
Boa demais para mim, claro.
Ai,
Deus. Tenho de colocar um lençol na cama. É horrível
dormir num colchão todo cheio de botões. Mas onde estão
os lençóis? Gostaria de comer alguma coisa.
SEXTA-FEIRA,
22 DE DEZEMBRO
Agora
que o Natal está chegando, sinto uma espécie de ternura
em relação a Daniel. É inacreditável eu
não ter recebido um cartão de Natal dele (embora eu
também não tenha conseguido mandar nenhum até
agora). Parece estranho ter estado tão próxima dele o
ano inteiro e não ter mais nenhum contato. Isso é muito
triste. Talvez Daniel tenha virado um judeu ortodoxo. Talvez amanhã
Mark Darcy telefone para me desejar Feliz Natal.
SÁBADO,
23 DE DEZEMBRO
58,9kg,
12 unidades alcoólicas, 38 cigarros, 2.976 calorias, 0 amigo
ou pessoa querida para me cumprimentar nessa época
festiva.
18h.
Resolvi ser uma solteira sozinha em casa, igualzinha à
princesa Diana depois do divórcio.
18h05.
Onde estão as pessoas? Imagino que estejam todas com seus
namorados ou em casa, confraternizando com a família. Mas é
uma oportunidade para fazer tudo o que preciso ... ou eles têm
suas próprias famílias. Bebês. Criancinhas de
pijamas, rechonchudas, bochechas rosadas, olhando animadas para a
árvore de Natal. Ou vai ver que estão todos numa grande
festa, menos eu. Não tem importância, tenho um monte de
coisas a fazer em casa.
18h15.
Não tem importância. Falta só uma hora para
começar o
Encontro
marcado.
18h45.
Ai, Deus, estou tão
sozinha.
Até
Jude me esqueceu. Ela ligou a semana inteira, apavorada porque não
sabia o que comprar para Richard o Vil. Não quer nada muito
caro porque dá a impressão de que o caso está
ficando sério ou que ela está tentando humilhá-lo
(boa idéia, se ela quer saber). O presente também não
pode ser nada para vestir, já que essa área é um
convite aos problemas, podendo fazer Richard o Vil se lembrar da
última namorada, Jilly a Vil (para quem ele não quer
voltar, mas finge ainda gostar para não ter de ficar com Jude
- verme). A última idéia dela era dar uma garrafa de
uísque junto com outros presentinhos para não parecer
pão-dura ou neutra - talvez junto com moedas de chocolate e
tangerinas. Tudo depende da forma como Jude encara a cena Meias
Dependuradas na Lareira: uma coisa tão exageradamente chata
que chega a dar náusea ou, pelo contrário, algo muito
elegante em sua pós-modernidade.
19h.
Situação de emergência: Jude telefonou chorando.
Vem para cá. Richard o Vil voltou para Jilly a Vil. Jude culpa
os presentes. Ainda bem que fiquei em casa. Devo ser uma emissária
do Menino Jesus para ajudar os perseguidos no Natal por essa espécie
de Herodes, isto é, Richard o Vil. Jude vai chegar às
sete e meia.
19h15.
Droga. Tom telefonou e com isso perdi o começo de
Encontro
marcado
. Está
vindo para cá. Jerome, que tinha voltado para ele, terminou o
caso e voltou para o ex-namorado que faz parte do coro do musical
Cats
.
19h17.
Simon vem para cá. A namorada dele voltou para o marido.
Graças a Deus fiquei em casa, assim posso receber os amigos
chutados por seus respectivos casos como se eu fosse a Rainha de
Copas ou a Deusa da Bondade. Mas sou uma pessoa assim mesmo: gosto de
gostar dos outros.
20h.
Viva! Um milagre natalino. Daniel acaba de ligar dizendo com a voz
enrolada:
—
Jonesh.
Eu te amo, Jonesh. Cometi um erterrível. A idiota da Suki é
de plástico. Peitos sempre apontando para o norte. Eu te amo,
Jonesh. Vou aparecer na sua casa para dar uma olhada na sua saia.
Daniel:
o maravilhoso, confuso,
sexy,
maravilhoso, engraçado. Daniel.
Meia-noite.
Argh. Nenhum deles apareceu. Richard o Vil mudou de idéia e
voltou para Jude. O mesmo em relação a Jerome e à
namorada de Simon. Tudo não passou de uma exasperação
emocional do espírito natalino que fez todo mundo ficar
inseguro a respeito de ex-casos. Melhor nem falar em Daniel, que
ligou às dez da noite para dizer:
—
Escute,
Bridge. Você sabe que todo sábado à noite eu
assisto ao jogo na tevê, não? Posso ir amanhã
antes do jogo?
Incrível?
Fantástico? Extraordinário?
1h
da manhã.
Estou completamente só. O ano foi um fracasso total.
5h
da manhã.
Droga, não tem importância. Talvez o Natal não vá
ser uma chatice. Talvez meus pais apareçam na manhã
seguinte, de mãos dadas, meio sem graça, dizendo:
"Crianças, precisamos conversar uma coisa com vocês",
e eu poderia ser dama de honra na cerimônia de confirmação
de votos conjugais.
24
DE DEZEMBRO
NOITE DE NATAL
58,9kg,
1 mísera taça de xerez, 2 cigarros sem a menor graça,
já que fumados escondido, na janela, cerca de um milhão
de calorias, 0 pensamento festivo.
Meia-noite.
Estou meio confusa sobre o que é real ou não. Tem uma
fronha de travesseiro na beira da minha cama que mamãe colocou
antes de ir dormir, dizendo: "Vamos ver se Papai Noel vem."
A fronha agora está cheia de presentes. Mamãe e papai
estão separados e pensando em se divorciar, mas dormindo na
mesma cama. Por outro lado, meu irmão e a namorada, que moram
juntos há quatro anos, estão em quartos separados. Não
sei direito por que tudo isso, a não ser que seja para não
preocupar a vovó que a) está maluca e b) ainda não
chegou. A única coisa que me mantém ligada ao mundo
real é que, mais uma vez, estou passando o Natal de um jeito
humilhante: dormindo sozinha numa cama de solteiro na casa de meus
pais. Talvez papai esteja neste instante tentando transar com mamãe.
Argh, argh. Não, não. Por que o cérebro da gente
pensa essas coisas?
SEGUNDA-FEIRA,
25 DE DEZEMBRO
59,4kg
(ai, Deus, virei um Papai Noel, um pudim de Natal, ou similar), 2
unidades alcoólicas (completa vitória), 3 cigarros
(idem), 2.657 calorias (quase só molhos), 12 presentes de
Natal sem nada a ver comigo, 0 presente de Natal com alguma coisa a
ver comigo, 0 reflexão filosófica a respeito de uma
Virgem dar à luz, número de anos desde que não
sou mais virgem, hum.
Desci
para a sala, esperando que meu cabelo não estivesse com cheiro
de cigarro. Mamãe e Una trocavam opiniões políticas
e punham enfeites na ponta das couves-de-bruxelas.
—
Ah,
sim, eu acho aquele homem - como é que ele se chama? –
muito bom.
—
É,
quer dizer, mas ele se meteu naquela - como é que se chama? -
maracutaia que ninguém esperava, não?
—
Ah,
mas então é melhor você tomar cuidado porque pode
acabar tendo um problema como aquele - como é mesmo o nome
dele? - que costumava perseguir os mineiros. Mas sabe de uma coisa?
Salmão defumado não me faz bem, sinto uma azia,
principalmente depois que comi muita castanha-do-pará com
cobertura de chocolate. Ah, olá, querida - disse mamãe,
quando apareci.
—
O que você vai usar no Dia de Natal?
—
Isto
aqui - murmurei, de mau humor. .
—
Ah,
não seja boba, Bridget. você não pode usar isso
no
Dia de Natal
.
Não vai aparecer na sala para cumprimentar tia Una e tio
Geoffrey antes de mudar de roupa? - perguntou, com aquela vozinha
especial de não-está-tudo-ótimo? que significa
"Faça o que estou dizendo ou passo o espremedor elétrico
Magimix em você".
—
Olá,
como está, Bridget? Como vão os namorados? - brincou
Geoffrey, dando um daqueles abraços especiais, ruborizando e
puxando o cós da calça para cima.
—
Ótimos.
—
Quer
dizer que você ainda não arrumou um namorado. Arre! O
que a gente faz com você?
—
Isso
é um biscoito de chocolate? - perguntou vovó, olhando
para mim.
—
Levante
os ombros, querida - segredou mamãe.
Meu
Deus, por favor,
me
ajude. Quero ir para casa. Quero minha vida de volta. Não me
sinto adulta, parece que sou uma adolescente que todo mundo fica
irritando.
—
Então
como
é
que vai fazer em relação a bebês, Bridget? - quis
saber Una.